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O expurgo: alexandre costa

  • Foto do escritor: Cafe e outras Palavras
    Cafe e outras Palavras
  • 15 de out. de 2020
  • 2 min de leitura

Os fantasmas se multiplicavam em cima da mesa de Roberto. Apareciam em forma de pastas de trabalho, documentos de Recursos Humanos, envelopes de pedidos de aposentadoria, folhas de formulários grossos que deveria preencher com as piores experiências que já teve na vida em ordem alfabética, nomes incompreensíveis de pessoas mortas que teimavam em querer voltar à memória dos vivos.

Seus esforços em preencher os formulários, dar saída nos pedidos de aposentadoria, arrumar as divergências nas folhas de ponto dos seus colegas de trabalho de nada adiantavam. Assim que ele se virava para ajeitar toda essa papelada na caixa de saída, outra papelada se materializava na caixa de entrada. Os papéis flutuavam a sua frente como bolhas de sabão, as pastas caíam em seu colo, novas tarefas pipocavam na tela do computador. Roberto tinha certeza que seu pesadelo havia se materializado para acabar de vez com o pouco de sanidade que ainda restava dentro dele.

Passou a manhã toda e depois a tarde inteira nisso, e quando se preparava para o descanso de final de expediente se deu conta de que não havia para onde ir. Não havia saída, de nenhum tipo, não havia portas, não havia uma janela por ponde pudesse escapar, nem havia respostas, era uma situação irreparável.

Uma pasta grossa passa voando por sua cabeça e ele percebe que é um aviso de férias de um de seus colegas de trabalho. Ele não pensa duas vezes, se agarra à pasta e deixa-se levar por ela. De repente ao abrir os olhos depois de um voo rasante por cima da mesa do diretor, ele escorrega pela borda do papel até uma escotilha aberta no meio da sala, flutuando no espaço.

E de repente não existem mais fantasmas e ele está sentado em uma poltrona confortável e exageradamente vermelha. Quando se levanta a poltrona desaparece e ele cai de novo no vazio. Foi um tombo tão grande que ele precisou se apoiar na borda da cama para se levantar e descobrir que era domingo e seu pesadelo não tirou folga nesse fim de semana. Ele se levanta na esperança de que uma ducha vai melhorar seu dia. Ele entra no banheiro e lá estão sua mesa e todas as pastas e documentos que precisa despachar, elas continuam se multiplicando, uma pilha enorme que vai até o teto. Nada pode parar a avalanche de pastas que aparecem sem cessar a sua frente. Ele sai do banheiro, abre a porta e dá de cara com seu chefe no meio da sala. O que você está fazendo aqui na minha casa? – você pergunta. Mas a única resposta que encontra é o despertador gritando no seu ouvido às seis e meia da manhã.

Roberto se levanta e não consegue esquecer o sonho que teve. Vai para o trabalho na esperança de que o dia seja calmo e tranquilo. Ele está em sua mesa, sozinho, tranquilo, digita um texto no computador, ele esbarra na caneta que cai, ele abaixa-se para pegar de volta, ele volta-se para o computador e percebe que apareceram algumas pastas em cima da mesa que não estavam ali antes...

1 commento


Cafe e outras Palavras
Cafe e outras Palavras
15 ott 2020

Parece vagamente com minha existência..

Roberto Prado

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