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Wallpaper: alexandre costa

  • Foto do escritor: Cafe e outras Palavras
    Cafe e outras Palavras
  • 17 de jul. de 2020
  • 2 min de leitura

Configurei a sua foto no meu plano de fundo e agora você sabe tudo sobre mim. Você leu todas as minhas frases bobas e me viu chorar muitas vezes espremendo a solidão até que ela saísse de dentro de mim em forma de lágrimas ácidas. Você me viu várias vezes andando de um lado para o outro, me viu falando sozinho, fazendo gestos largos com todo o corpo numa cena óbvia e infantil.

Eu sentei em frente ao monitor e olhei para você por tanto tempo que me pareceu ver você sorrindo pra mim. Eu sei que a sua imagem na tela são só zeros e ums, mas como convencer meu cérebro do contrário do que os olhos enxergam?

Todas aquelas noites sem dormir, todas aquelas mulheres vazias e sem perfume, tudo só pra esquecer você.

Era só clicar o botão direito do mouse e eu me libertaria, colocaria uma paisagem idílica e me transportaria para lá e viveria na solidão que me cerca agora. Poderia ser uma ilha, uma casa nas montanhas, ou formas tão abstratas quanto a minha vida.

É só um papel de parede, tentava me convencer o tempo todo, mas na verdade não era só um papel de parede. A sua imagem na tela vinha carregada de uma história longa e difícil que não me deixava nem por um minuto, ela vinha com a força de uma derrota incompreensível para mim. E eu não sou de perder!

Você me encara todas as noites através de pixels e eu te devolvo o mesmo olhar de quando tirei aquela foto. Talvez por isso seja tão difícil deletar você.

Mas aconteceu uma noite, aconteceu que eu me despedi de você, aconteceu que eu formatei nossa relação em um novo espectro da realidade e não fiz backup. Desisti e tentei me erguer, ficar de pé diante da tela. Agora era diferente, mas não menos doloroso. Seus olhos não me acompanhariam mais, meus segredos não seriam mais seus.

Liguei o computador e lá estava ele, um novo wallpaper, uma imagem encontrada aleatoriamente na internet. Um feitiço seu ou um desejo meu? Não sei, talvez!

Eu a vi tão verdadeira em seus pixels e bits, tão pesada quanto se pode pesar a realidade dela. Eu não sei o que pensei na hora, ou foi você quem me sussurrou naquele momento. Agora não importa. Zeros e ums, fantasia, realidade aumentada, esquizofrenia, mundo real, o que era aquilo?

Aproximei e estiquei minha mão até ela e enquanto entrava através do monitor, como se atravessasse um espelho d’água, segurei-a na mão e percebi o que era aquilo tudo. Era real, tão real quanto se pode desejar ser. Sua forma era bela e a posse que eu sentia de tê-la fazia todo sentido para mim. Eu apagaria de vez a nossa relação nos dois mundos. Mas como? O gatilho suave, o coice na mão, o cheiro da pólvora, a escuridão. Eu senti tudo isso e ainda pude ver, no monitor estilhaçado pela bala, no papel de parede, seu rosto ainda com aquele mesmo olhar, mas um sorriso diferente, satisfeito!

O que foi que eu perdi?

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