Elucubrações: roberto prado
- Cafe e outras Palavras
- 22 de jun. de 2020
- 2 min de leitura

Seis horas, toca o despertador, acordo e me deparo com o chão coalhado de baratas mortas, suas pernas finas tremendo ao vento que entra pela janela.
As cortinas dançam com a mesmo aragem. Só faltava ouvir Marcha Fúnebre de Chopin...
Começar o dia assim...
Essa cena me faz voltar no tempo e me lembrar de frei Justino, - que Deus o tenha em um bom lugar! – que num domingo na hora da comunhão de repente quedou-se paralisado, em choque com a hóstia em suas mãos estendidas ao alto, quando sente uma barata passar sobre seus pés e correr em direção ao altar, com olhos esbulhados olhando em direção as fiéis, babando começou a murmurar para o coroinha:
- Tire esse cágado da igreja, tire esse cágado da igreja...
Patética era a sua situação, pois ninguém via em nenhum lugar na igreja o tal do cágado, e o pobre homem, por fim, surtou, enlouqueceu, e foi retirado da igreja á base de muito conversa...
Volto - essas minhas idas ao passado me dão vertigem - ao presente e as baratas continuam ali no chão, mortas de barriga para cima.
Nunca mais tive notícias de frei Justino...
Desvio-me delas, senão com nojo, com muita cautela...
O sol promete mais calor, a continuar assim esse clima logo os vizinhos me encontrarão morto, duro e suado na cama, e tal e qual essas “Periplaneta americana”- eu as odeio, mas as conheço - em decúbito ventral e como o velho Justino, de olhos esbugalhados, talvez ainda balbuciando:
- Os cágados, os cágados...
Vou à cozinha, reviro o armário, acho o inseticida que usei à noite passada, leio as instruções.
Penso com meus botões:
- Arma de destruição em massa, genocida... – como sou hipócrita, meu Deus! Eu sentia-me feliz, livre e mais limpo com a morte delas...
Por via das dúvidas resolvo jogar fora esse veneno. Não quero em minha consciência os fantasmas de meu passado me assombrando a cada inseto morto – e há tantos nessa cidade!
Vou dar uma volta, quando voltar arrumo alguém para limpar o apartamento.
Creio passarei uns dias fora...
Na rua, enquanto jogo o veneno no lixo, decido-me:
- Domingo vou à missa!
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