Meu sonho tem sabor de chá gelado de maçã verde: roberto feliciano

Sutilmente você sorri enquanto dorme, com a boca aberta. Até seus problemas respiratórios fazem parte disso tudo que você é. O edredom vermelho cobre apenas metade do seu corpo, dos tornozelos até a barriga. Você se vira graciosamente e deixa escapar preguiça por entre os lábios. Seus cabelos se espalham pelo travesseiro branco. O edredom desce um pouco mais para o limite da sua cintura.

Deitada na rede você não se balança muito pra não “ficar com tontura”. Seu escritor favorito do momento repousa em seu colo. Com a mão direita afaga sua cachorra, com a esquerda tateia o chão em busca do copo de café. O sol te ilumina inteira nesse momento do dia. Os olhos estão vivos, olhando as plantas, olhando o céu azul. Eu te olho com vontade de congelar momentos, sentimentos, sensações. Na vitrola, aquela banda que eu amo e que você nem teve vontade de procurar.

Você costuma abrir o chuveiro quando já está embaixo dele. Deixa a água cair de olhos fechados. Sente ela esquentar aos poucos e gosta da sensação de que ao menos alguma coisa na sua vida muda gradativamente, com calma. A água quente te acalma e deixa fios de cabelo grudados na nuca. Eu não consigo entender como a água passa por você e segue seu curso, como se você fosse uma dessas criaturas ordinárias que tomam banho apenas para ir trabalhar, estudar ou sair em um sábado à noite.

Em seu quarto, você veste a saia devagar, provocando sem saber que provoca. Demora pra escolher entre a blusa preta sem estampas e a azul clara com uma frase do Buda (ou será do Ghandi?). Decide não secar os cabelos, escolhe a pedra do dia que vai no pescoço, coloca o brinco que eu te dei só porque eu estou te olhando.

Afinal, você não gosta da possibilidade deles estragarem. Eu confesso que gosto dessa sua mania de não querer gastar as coisas que eu te dou.

Ainda descalça indecisa sobre o que calçar você me olha. Não percebe como seus pés me hipnotizam. Sorri como daquela vez e diz com a voz mais natural do mundo, como se não estivesse lidando com um tolo apaixonado:

- E aquele chá de maçã verde de que você tanto fala? Vamos?