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Da pobreza e de suas histórias, - Um cafezinho com: marcelo lemos

  • Foto do escritor: cafe & outras palavras
    cafe & outras palavras
  • 27 de jun. de 2019
  • 2 min de leitura

Atualizado: 12 de set. de 2019

vol. 2 – O consumo como chave do pertencimento


Certa vez li em um artigo, o quanto representava o mercado de licenciamentos, no faturamento de grandes marcas. Nunca passou por minha cabeça, tais valores.

A lógica revelada pelo articulista era de que o cidadão comum, ao comprar um boné com a marca Ferrari pelo preço 20 vezes maior de o de um boné comum, tinha a sensação, a “experiência” de gozar deste seleto clube. Ele tinha um boné exatamente igual ao do Schumacher.

- Sou igual a ele! – pensa o cativo.

Faz-se poderosos motores, para na verdade, ganhar dinheiro com a venda de chaveirinhos.

Isto deixou-me encucado, pois o tema nunca me foi motivo de reflexões.

Dias depois, ainda ruminando o artigo, lembrei-me de um fato acontecido no início de minha adolescência.

Por causa de minha família, fui nascido e criado na Igreja do Valongo.

O clube recreativo e social, o shopping center do pobre é a igreja.

Lá que encontra os amigos, tem seu lazer, seu convívio social.

Mesmo criança, participava de todas as atividades.

Trabalha em quermesses, ajudava nas missas, na cozinha (quando de encontros religiosos), nas atividades de promoção humana, campanhas do agasalho e por aí vai.

Foi em uma destas campanhas de agasalho, separando roupas para os pobres (na verdade, para os miseráveis. Pobre éramos nós), deparei-me com um lote de calças de marca, as quais só via na televisão. Fiorucci, Denim, Hollywood. Sim a Hollywood dos comerciais!

No inicio dos anos 80, os jovens ficavam hipnotizados com o mundo de ” Hollywood, o sucesso”, magistral campanha do homônimo cigarro que marcou os jovens de uma geração.

Além do cigarro, tinham tênis, calça, jaquetas, camisas, discos, tudo isto com um design e trilha sonora, meticulosamente desenhada.

Parecia que eu havia encontrado ouro naquela pilha de roupas.

Com escrúpulos e pudor que herdara de meus pais, não ousaria em pedir que me dessem ou vendessem as calças, foi quando pedi somente para retirar suas etiquetas...

Autorizaram. Deram-me as etiquetas.

As roupas que usava era as que minha mãe comprava “di baciada”, o que não me impediu de ao chegar em casa, com uma gillette, retirar as etiquetas de algumas calças e substitui-las pelas novas.

Agora, parecia que eu era gente.

Desfilava com minha calça Hollywood. Viadagem? Não. Apenas deslumbramento de uma criança pobre...

A calça acabou, mas a etiqueta mudou-se ainda mais duas vezes, até que a mesma se acabou.

Nesta história, revista trinta e nove anos depois, fica claro como somos facilmente conduzidos pelo consumo, para gozarmos do paraíso das setenta e duas virgens, do Monte Olimpo.

Nossa pobreza é material, financeira, mas nossa miséria, esta é crítica, cultural.

Em uma sociedade que imolou o cidadão em detrimento ao consumidor, só desta participa, a ela pertence, aquele que consome.

1 Comment


rpjbarbosa
Jul 10, 2019

Um prazer tê-lo em nossa Revista.

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