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Fraude: roberto prado

  • Foto do escritor: cafe & outras palavras
    cafe & outras palavras
  • 3 de jul. de 2019
  • 2 min de leitura


Seu grande sonho, desde a mais tenra idade, era ser caçador.

- Maldito Jim das Selvas! – ele sempre repetia isso quando ficava de mal humor.

Ele tem em sua sala de estar trinta e três baratas empalhadas em três potinhos de maionese light, cento e dois tipos de borboletas, sendo que nenhuma é azul, em molduras espalhadas pelas paredes – ele nunca se apaixonou de verdade; quatro ratazanas albinas, duas lagartixas - uma malhada; dois gatos, sendo um siamês, um cavalo – que ele não conta a ninguém, mas que já o achou morto numa rua, todos empalhados também, e na parede uma foto de Ernest Hemingway. Na mesa de carvalho um cinzeiro nunca usado e uma caixa de charutos nunca aberta.

Todo o dia ao acordar abre as janelas do quarto suspira fundo e reclama baixinho:

- Sou uma fraude!

Veste seu roupão e desce para o café...


***


Então um dia, entre uma taça de conhaque e outra, desabafou:

-Sempre, sempre odiei o Alberto, sempre. Ele sempre foi o mais bonito da classe, o mais elegante, o mais bem vestido, mais bem penteado, sempre com aquele porte de Apolo de subúrbio, sempre sorrindo, sendo o primeiro da classe, sempre o primeiro a responder, sempre simpático comigo e com todos, sempre pagando a primeira rodada de café, aposto que quando ele peidava, soltava perfume de rosas... Mas agora estou feliz, soube que ele está com problema de próstata! E pensar que devo meu diploma a ele...

Esvaziou mais três taças de conhaque, amarrando o roupão foi ao terraço, de lá olhando para seu jardim resmungou:

- Morro velho e não conhecerei os prazeres de se caçar na África...

Voltando para dentro da casa gritou com o primeiro serviçal que passou pela sua frente.


***

Numa madrugada dessas, encharcado de suor ele acorda aos gritos de:

- Coelhos não miam, coelhos não miam, coelhos brancos não miam, coelhos pretos não miam, coelhos malhados ou albinos não miam!

De manhã não tomou café e trancou-se na sala de troféus.

Gervino, o serviçal, receoso do humor do patrão, nem lhe entregou o exemplar do Diário Oficial da União, recém-entregue, e da porta da sala ouviu o patrão arengar:

- Coelhos não miam, coelhos não miam, coelhos brancos não miam, coelhos pretos não miam, coelhos malhados ou albinos não miam!

O dia prometia ser horrível...


***


10 na cabeça!

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