O café: roberto prado
- Cafe e outras Palavras
- 28 de mai. de 2019
- 3 min de leitura

Esnobar
É exigir café fervendo
E deixar esfriar.
-- Millôr Fernandes
Pior que um café ruim, é um café gourmet...
O autor!
- O negócio começou muito mal – comentei com o Magrão - olha a barata correndo aqui debaixo da mesa, rápido ela está indo para a mesa perto da parede!
- Ela saiu da caixa da geladeira – comentou discretamente o Magrão...
- Só podia ser de lá! – respondi gozando de júbilo belicoso
Complicado o diálogo? Vamos começar do começo.
Como já citei anteriormente, diariamente após o almoço, vamos tomar um cafezinho. Antes éramos assíduos da Bolsa Oficial do Café de Santos, nome pomposo, mas por causa do atendimento, dos frequentadores, do preço, e por fim, não abrir às segundas-feiras foi a gota d’água para nos mudarmos de uma vez de lá.
E descobrimos esse novo “point”, de onde vem essa história de hoje.
Desde a primeira vez que lá entramos, nos “entocamos” numa mesa de dois lugares atrás do caixa. Lugar muito aprazível, pois não éramos vistos por nenhuma pessoa, o que era de grande ajuda para nós, pseudos-cronistas de mundanidades. Um ponto estratégico para estudar a humanidade. Ah, esse nosso empenho em compreender o próximo...
O café era muito bom e preço idem, atendimento, sem reclamações. Éramos muitos felizes em nosso domicílio, éramos...
Mas o lugar acabou por ficar muito frequentado e com fregueses exigentes, tão exigentes que passaram a demandar por outras marcas de cervejas.
Pausa!
O leitor deve ter se assombrado, pois falei até agora em café e passo para fregueses reclamando de cervejas! Pois lá é também um restaurante, espaço grande, mas exploramos somente a cafeteria, tudo o mais nos é desimportante.
Voltemos, pois, ao drama inicial.
Para atender a sua seleta clientela (entra aqui um ranço de amarga ironia) ele nos informou que teria que sacrificar nosso “cantinho” para instalar ali, bem ali, naquele espaço sacro-santo de nosso cafezinho cotidiano, a bendita geladeira.
- Mas ainda vai demorar uns dias. – falou de forma a nos confortar.
Mas não tardou muito e o dia chegou, e o dia foi hoje.
Já estávamos sentados, quando o gerente chegou e nos disse:
- Ela chegou! – Disse isso e juntando ação às palavras começou a levar nossas xícaras para outra mesa no extremo oposto do salão.
E lá alojados, tristes, vimos a caixote que trazia a tal da geladeira. Exemplar antigo, com puxador, modelo anos cinquenta, numa cor entre bege e o amarelo, desbotada, feia e antipática.
Três pessoas para carregá-la e depositá-la.
Da mesa, quase escrevo “canto”, ficamos observando a operação de desencaixotamento do refrigerador. Foi quando, para nossa mal-sã alegria, vimos aquele ortóptero supracitado sair do meio das madeiras e correr entre as mesas.
- Tá vendo? – disse eu com uma placidez invejável – Se tivessem nos deixado quietinhos em nosso canto isso não teria acontecido... e acompanhava o dito inseto rastejando em direção ao centro do salão. Já pensava em pedir outra xícara de café para ver o espetáculo de histeria e confusão...
Mas essa é a minha versão do caso, deixo que o Sr. Costa, relate, um dia, o seu ponto de vista.
Muito embora, não haja ponto de vista que devolva a nossa velha mesinha abrigada atrás do caixa e que nos dava uma visão privilegiada das mulheres que subiam as escadas para se servirem no bufê do primeiro andar...
É, meu ídolo tem razão, a vida não presta!
Em tempo, quase que intitulei esse texto de A BARATA E O CAFÉ, mas pensando bem, ficaria alguma coisa entre kafkiano e repugnante e conhecendo bem o Magrão, ele iria reclamar disso também.
Em tempo², achei por bem não declinar, em nome bom gosto, a dita cafeteria.
Até onde sei, acho que a barata foi feliz para sempre, pois pelo que vimos ela conseguiu escapar de todos os seus captores (os garçons com vassouras e as garçonetes com sapatos de bico fino)
Comments