o dia do ciclista e a nossa memória do joão: roberto prado

Era uma vez...

Dois amigos que resolveram criar um grupo teatral, sim naquele tempo era fácil juntar uma meia-dúzia de loucos sonhadores e criar um grupo. E assim sendo fácil criamos o “GRUPO HETÍLICO-TEATRAL JOÃO CICLISTA” tido & havido como “O GLORIOSO!”.

Só o Altíssimo sabe nos dizer quanto tempo duramos, fisicamente, pois na memória de seus participantes seguimos vivos, pulsantes e trôpegos!) pois nunca nos demos ao trabalho de registrarmos ata, fazer documentos ou mesmo tirarmos fotografias (à época coisa luxuosa, pois as máquinas eram caras e as revelações idem). Somos como filhos sem registro civil, simplesmente existimos, mas não provamos quê!

Mas, como no parágrafo anterior, vivemos de lembranças, falamos do G.E.T. – J.C. como se fosse ontem. Nossas vitórias pífias, mas o que nos tornaram imortais na memória dos que nos conheceram à época são nossas Derrotas com “D” maiúsculo mesmo!

Ensaios todos os fins de semana ora no Teatro Municipal, ora na Cadeia Velha, ora no Teatro dos Metalúrgicos – esse logo descartado pela Presidência desse sindicato, pois nosso trabalho não tinha qualquer laivo de lutas de classe - sempre regada, antecipadamente com o que houvesse com alto teor alcoólico.

Ah!, éramos jovens, tínhamos a força, o tesão, a vontade (nunca de mudar o mundo, pois mesmo sendo (na época um mundo cão, ele mais nos lambia que mordia, era ruim, mas ficou bem pior depois...) e sermos reconhecidos como artistas...

Mas esse mundo não estava preparado para o João (sim, nos tornamos todos íntimos assim...) e um (não, não belo dia) ele acabou-se.

Desgraçadamente, miseravelmente ele chegou ao fim num dia de semana no palco do Teatro Municipal numa apresentação para censura (sim o João também teve seus entreveros com a Ditadura!, isso a oposição não vê!)

Como chegamos a isso?

Depois de um fracasso retumbante (Ah! O João e seus fracassos, nunca menos que retumbantes, nunca!) com a peça Meia-sola, que depois de meses de extenuantes ensaios, acabou tem sua estreia em outra cidade uma semana antes...

Resolvemos por bem dar-nos umas férias.

(fosse esse texto uma novela radiofônica, entraria a vinheta dramática)

Ai começou a nossa desdita!!!

Num dos bares que frequentávamos, estávamos à mesa bebendo e chorando e lambendo as recentes feridas e questionando nossa capacidade de lutara mano-a-mano com o Destino, quando umas pessoas numa mesa ao lado, ouvindo nossas lamurias achegaram-se.

Disseram que haviam ouvido nosso problema e que queriam nos fazer uma proposta (outra vinheta dramática, please!).

Desiludidos, estávamos frágeis e prontos para uma roubada.

Propuseram-nos o pessoal (que depois-maldito destino esse nosso! – descobrimos serem egressos do grupo que anteriormente nos ferraram com a peça Meia-sola) que lhes emprestassem o nome GRUPO ETÍLICO-TEATRAL JOÃO CICLISTA -O GLORIOSO para ele montarem a peça A PENA E A LEI de Ariano Suassuna.

Entorpecidos pelos vapores do álcool, pelo desgosto, pelas gordurosas batatas fritas, topamos e dissemos:

- Sim!

E de forma assombrosa fomos levados num turbilhão vertiginoso para o fundo, para o fracasso final, para a Censora...

Do momento em que se abriram as cortinas até o momento que nos despedimos na rua tudo é um borrão recheado de dor, vergonha, náusea, vontade de morrer, ânsia de matar e um vórtice descendente de baixa alto-estima...

Levou anos para que eu e Vadinho voltássemos a tocar nessa ferida.

Todo esse texto foi só o preâmbulo para uma mensagem trocada por wattsapps com o supracitado Vadinho:

[19/8 07:21] .: Sabe que dia é hoje?

[19/8 07:22] .: *DIA DO CICLISTA!*

Diga algo sobre *O GLORIOSO!*

[19/8 07:25] Vadinho Cel: 19 de agosto. Certamente alguém chamado João que por alguma razão seja ciclista deve ter nascido hoje. Bela e justa homenagem a trois.

[19/8 07:57] .: O senhor, positivamente, não presta...

😘

[19/8 07:58] Vadinho Cel: Obrigado. Eu... acho.

[19/8 09:02] .: 😕

Passados tantos anos, ele acaba por tornar-se um cínico...

Cai o pano!

FIM

Clap your hands, clap your hands!