O narigudo: roberto prado

Não iria ao Café hoje.

Não estava com vontade ir, tempo nublado, calor, promessa de chuva ao fim da tarde, pés inchados, e outras desculpas para não ir ao café hoje...

Tomei café na baiana, perto da repartição, para não ir para o Centro da cidade e não ir à cafeteria. Ao sairmos me despedi do colega e fui dar caminhada larguei o corpo no piloto automático e fui...

...para na Cafeteria.

Fui recebido à porta.

Milagrosamente “minha” mesa estava disponível perto do balcão. Lá estava como eu gosto e os proprietários não:

- Vazio! - Somente eu e os donos!

Conversamos bobagens, rimos das besteiras políticas... Quando de repente um deles me pergunta por um amigo em comum:

- Cadê fulano?

- Sei lá, não me diga que ele morreu e vai nos dar paz? – ele nos perturbava até, quase, nos levar às lágrimas. Sabíamos que ele estava chegando a um quarteirão de distância.

-Sim, hoje! – o céu ruiu!

Ai o silêncio que estava escondido em algum lugar preparando bote, caiu sobre todos nós...

As lágrimas quase rolaram, mas me segurei.

Nos olhamos num silêncio que não se ouve aqui no Centro da cidade. Não havia palavras para descrever buraco existencial que sentíamos.

- O Narigudo morreu! – murmurei.

Como ele morreu? – perguntei com a voz embargada. Estava na cara que ele estava predestinado a ser o último de nós a ir-se embora. Era dele a missão de apagar as luzes e fechar a porta (embora, irresponsável que era não faria nada disso e ainda deixaria os cães da rua para dentro...).

O bagunceiro se foi...

Quem vai falar alto, quem vai incomodar as pessoas, quem vai mandar bilhetinhos indecorosos às mocinhas das mesas ao lado da nossa?

Quem vai cobrir esse vazio?

E aquele narigão que todos tínhamos vontade de socar? Quem se sentará à nossa mesa pedirá quatro cafés para três pessoas (ele pedia duas xícaras para si, para não ter que esperar a segunda rodada...)?

Caralho, que inveja de Deus, vai ter o Narigudo só para si para lhe encher seu Sacro Saco agora...

Ciau Thiago!