top of page

Sobre o que se passa na loucura: alice bispo

  • Foto do escritor: Cafe e outras Palavras
    Cafe e outras Palavras
  • 24 de mai. de 2019
  • 2 min de leitura

Atualizado: 27 de mai. de 2019

"O poder corrompe. E a posse do poder absoluto, corrompe em absoluto."

-Hannah Arendt - 'O que é política'.


Aquela sirene era o início da minha vida.

Os gritos, eu sentia os gritos entrando, me estuprando, me inflando. Enquanto eu andava-pulava-pulava-andava. Tudo se misturando e eu ia junto sentindo a mudança lentamente. E ele gritava mais alto e os jeans apertando suas bolas e a guitarra descontrolada arranhando meus ouvidos...

Era o meu lado que fervia e eu me sentia fervendo. Era o primeiro minuto da minha música favorita. E que eles todos vão à merda, porque nada muda o fato de eu pertencer ao que eles repudiam.

O poder saliva. O poder pulsa. O poder é urgente. Nojento. Vazio. Mas incrivelmente suculento. E se a sirene parasse, eu pararia também. Mas ela não parou e eu saí. As minhas roupas continuam sujas, cheias de lama do canto do quarto. A cama continua arrumada e cheirosa. A última coisa que queria era ter aquele cheiro em mim. Eu era como um cachorro que após o banho se lança à sujeira por identidade. Aquele canto cheio de larvas recém-nascidas era o meu luxo e poder.

Eles não se importam se você entendeu ou não e você continua fazendo errado. A política não é nobre porque se propôs pelos podres. Que ingenuidade.

O inferno é música baixa.

Eu vivia por um pouco mais de esperança, não desespero nem saudade. Eu vivia o que eles presumem ser a imundície completa. E me sentia limpo. Sem os compromissos banais. Sem a maquiagem. Sem as máscaras. Sem o álibi. Sem egos e pressões sociais ordinárias. Eu pensava por mim. E que eles se fodam. Eu estava me curando da podridão.

Mas eu não sinto falta daquela verdade e daquela realidade. Eu nunca tive verdade. Um homem é criado para ser estável. E era tudo o que eu sabia...

Mas a dor. Essa sim não é estável. A memória, tão egoísta, só lembra o que lhe convém. E a dor e a memória, instáveis e orgulhosas, são as pequenas farpas que não saem do canto do pé.

Na minha sirene houve paz. Eu ouvia os gritos cortados. Eu flutuava naqueles animais abatidos. Eu era vigiado pelos bocais pretos daquelas máquinas, onde outras dezenas me veriam e veriam a sirene. Eu sentia minhas veias pulsando, minha própria vida me chamando: eu me sentia vivo.

Hoje eles terão comida fresca.

Mas por um roubo?

Só um?

Coitados.

Enquanto a minha isca é comida, o resto tem o banquete nos dentes.

Mas, a fome é fato e a riqueza objetivo.

Eu sou louco pelo alívio que senti quando me pegaram? Talvez.

Mas, foda-se, é rock and roll.

Comments


©2019 by CAFÉ E OUTRAS PALAVRAS. Proudly created with Wix.com

bottom of page